Monday, April 17, 2006

Inside Out

Desta vez estou descalço. E não são pedras nem plantas espinhosas que piso. É terra. Macia, castanha escura e levemente húmida. Não de orvalho, pois não está fria. Cheira a clorofila, a verde, a fresco.
No meio de fetos e abetos com quase três metros de altura erguem-se árvores a vinte metros. Maciças, com casca grossa e firme. Não, hoje não há pássaros nem outros animais. Apenas silêncio. Nem vento, nem nuvens...apenas uma bruma leve...como que um fuminho.
Cheira-me a laranjas. Acabadas de descascar. E que ao serem descascadas aspergiram o seu sumo sobre tudo em redor. Não está frio. Não está calor. Diria que o ar aqui à volta está à exacta temperatura do meu corpo.
Ao andar não se ouve o restolhar da terra debaixo dos meus pés nem os galhos a partir-se sob o meu peso. Peso? Não ando...como que deslizo sobre a terra. Olho para baixo. É dela que exala esta neblina transparente.
E ao aspirar este ar, sinto que o meu organismo se limpa de todas as impurezas. Com o silêncio o meu raciocinio apura-se. A minha visão está mais nítida e sou capaz de sentir o andar das formigas debaixo da terra.
Ali ao lado vejo um regato de água límpida. Vejo-o, mas não ouço a água a correr. Estranho. Por mais que me esforce não consigo ouvir nada. Aliás nem ouço os meus pés que agora arrasto no chão tentando fazer barulho.
Quando falo, apenas ouço um conjunto de sons disformes. Se assobio, ouço gritos. Calo-me. Então começo a ouvir. A ouvir nitidamente uma voz que vem de dentro de mim. Não do peito, nem da alma, nem do coração. Deixem-se os poetas desses disparates.
É uma voz que vem da minha mente, do meu intimo sim, mas não da emoção. Da razão.
Sei quem és. Falo contigo todos os dias. Em todos os momentos é contigo que troco opiniões, discuto pontos de vista e converso sobre tudo e mais alguma coisa. Quase sempre é contigo que me confesso. Conheces-me tão bem como eu a ti. Ainda bem que aqui estás. Gosto de falar contigo.

5 comments:

Anonymous said...

Bitchoman,
Já se linkou ao Amar-ela? Vá lá, é só clicar no logotipo do "Páginas amar-ela" que fica ao fundo da coluna do lado direito e adicionar este espaço fantástico!
A sua presença não pode faltar!
Beijinhos,
Daniela

MS said...

A voz da Razão é indissociavel da voz da Alma, Sensibilidade, Coração... chama-lhe o q quiseres, mas ñ podes negar! Descartes estava 'errado'!!

No entanto a 'nossa inteira' voz é sem duvida a mais autêntica! Só ela nos compreende e nos dá as respostas em tempo certo!

bjs

Maria Carvalho said...

Lindo texto!! O cheiro...'das laranjas acabadas de descascar...'. Beijos.

Bitchoman said...

Miosotis: Descartes era um filósofo...eu não...mas gostei de o ler nesse livro!

Paula: Acabei por falar nos cheiros...rsrsrsr!

Anonymous said...

...tem graça, este texto teu remeteu-me à ideia de estar num útero, protegida, cuidada, pura...

Fica bem.